A neurociência tem nos ajudado a entender cada vez mais como o cérebro aprende. Mas, junto com descobertas, também surgiram algumas ideias que parecem científicas, mas não têm base real. Chamamos essas crenças erradas de neuromitos, e dois dos mais difundidos na educação são os “estilos de aprendizagem” e a “pirâmide da aprendizagem”. Embora pareçam fazer sentido à primeira vista, quando olhamos para as evidências científicas, percebemos que podem mais atrapalhar do que ajudar.
O neuromito dos estilos de aprendizagem
Se você já ouviu que algumas pessoas aprendem melhor de forma visual, outras de maneira auditiva e outras de forma cinestésica, saiba que essa ideia é um dos neuromitos mais populares. Parece intuitivo pensar que adaptar o ensino ao “estilo de aprendizagem” de cada estudante melhoraria o aprendizado. O problema? Não há evidências científicas que sustentem isso.
O cérebro humano não processa informações de forma isolada. Quando aprendemos algo, envolvemos múltiplos sentidos ao mesmo tempo. Por exemplo, ao se lembrar de uma viagem especial, você provavelmente não recorda apenas do que viu, mas também do que ouviu, sentiu, cheirou e experimentou. O aprendizado funciona da mesma maneira: ele é interconectado e não limitado a um único canal sensorial.
Acreditar nesse neuromito pode ser prejudicial porque leva professores a rotular estudantes e limitar as formas de ensino. Se um estudante for classificado como “visual”, pode acabar sendo exposto a menos oportunidades de aprendizado por meio de outras abordagens, quando, na realidade, a diversidade de estímulos é essencial para fortalecer a aprendizagem.
O que fazer então?
Ao invés de tentar encaixar cada estudante em um “estilo”, os professores devem oferecer experiências variadas que engajem diferentes sentidos e habilidades. Por isso, preferencie em:
- Apresentar os tópicos de de aprendizagem de maneiras diferentes (visual, auditiva, prática);
- Considerar o conhecimento prévio dos estudantes;
- Levar em conta a motivação e os interesses dos estudantes;
- Considerar que a aprendizagem ocorre em um ambiente interativo e participativo.
O neuromito da pirâmide da aprendizagem
Outro neuromito muito comum é a Pirâmide da Aprendizagem, um modelo que sugere que diferentes métodos de ensino resultam em níveis fixos de retenção de conhecimento. Você já viu algo assim?
🔺 10% do que lemos
🔺 20% do que ouvimos
🔺 30% do que vemos
🔺 50% do que discutimos
🔺 70% do que praticamos
🔺 90% do que ensinamos a outras pessoas
Embora pareça “bom”, essa pirâmide não tem base científica. Não há pesquisas confiáveis que confirmem que “ensinar a alguém” leva exatamente a 90% de retenção, assim como “ler um livro” significa reter apenas 10%. Na realidade, a aprendizagem é um processo muito mais complexo e não pode ser reduzida a números fixos.
O que realmente influencia o aprendizado?
- O tipo de conteúdo: Aprender matemática não é igual a aprender um novo idioma.
- O contexto: Estudantes aprendem melhor quando estão motivados e engajados.
- A experiência individual: Cada estudante tem um histórico de aprendizado e formas próprias de consolidar o conhecimento.
Ou seja, não existe uma fórmula mágica para aprender melhor. Estratégias que combinam diferentes abordagens, incentivam a participação ativa dos estudantes e fazem conexões com o conhecimento prévio tendem a ser melhores.
Por que isso é importante para professores?
- Para não adotarmos métodos “eficazes” sem questionar sua validade científica.
- Para usarmos abordagens diversificadas que respeitam a complexidade do aprendizado.
- Para nos atualizarmos continuamente, incorporando descobertas da neurociência e da educação.
Os neuromitos são sedutores porque simplificam conceitos complexos, mas podem levar a práticas educacionais ineficazes. A ciência mostra que:
- Não existe um único estilo de aprendizagem – aprendemos melhor com múltiplas abordagens.
- O aprendizado não pode ser reduzido a uma pirâmide fixa – ele depende de diversos fatores.
- A melhor estratégia para ensinar é aquela que envolve os estudantes de forma ativa, diversificada e significativa.
A neurociência e a educação precisam caminhar juntas, mas sempre com um olhar crítico e embasado. E você, já caiu em algum desses neuromitos?
Para saber mais:
Lawrence, Breanna C.; Ntelioglou, Burcu Yaman.; Milford, Todd. It Is Complicated: Learning and Teaching Is Not About “Learning Styles”, 2020.
Letrud, K.; Hernes, S. Excavating the origins of the learning pyramid myths. Cogent Education, 5(1), 1518638. 2018.